MARCO REGULATÓRIO MUDA FORMA DE CELEBRAR PARCERIAS COM ORGANIZAÇÕES SOCIAIS

> As prefeituras de todo País devem se preparar para, a partir de 2017, colocar em prática uma nova forma de celebrar parcerias com as organizações da sociedade civil, as chamadas OSCs.

A Lei Federal 13.019/2014,ou Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), que começou a vigorar em janeiro para os governos estaduais e a União, passa a valer para os municípios a partir do ano que vem, não por coincidência no início dos mandatos dos novos prefeitos, que serão eleitos a partir do próximo mês de outubro.

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A importância do tema não é irrelevante. Em todo País, há mais de 324 mil organizações da sociedade civil, entre elas fundações e associações privadas sem fins lucrativos, que recebem recursos públicos, atuando nas mais diversas áreas, muitas delas em convênios com o poder público, executando tarefas importantes para a sociedade, inclusive de atendimento à população. Juntas, tais organizações empregam mais de 2,2 milhões de pessoas.

Segundo a advogada Laís de Figueirêdo Lopes, assessora especial do ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, a criação deste Marco Regulatório foi uma demanda das próprias organizações sociais, que não tinham uma segurança jurídica com os convênios firmados com o poder público. “A lei traz esta segurança jurídica e também mais transparência para as parcerias celebradas com as administrações públicas, além de ajudar no combate à corrupção”, afirma.

Todas as parcerias celebradas entre as administrações públicas e as OSCs devem seguir as regras do novo Marco Regulatório. A pedido das entidades municipalistas, as prefeituras são obrigadas a seguir a lei apenas a partir de janeiro de 2017, enquanto estados e governo Federal já devem utilizá-la. “Este tempo foi solicitado para que os municípios pudessem criar capacidade de se organizar e aprender com a experiência dos governos estaduais e Federal. Além disso, este é um ano eleitoral. Mas, as prefeituras que se sentirem aptas podem se antecipar e aplicar a legislação antes de 2017”, salienta a assessora.

O que a lei traz de novo

O MROSC obriga que as administrações municipais façam o chamamento público, para realizar qualquer parceria com organizações da sociedade civil. Desde 2011, o chamamento público(1) é obrigatório para o governo Federal, mas, a regra ainda não valia para estados e municípios. Além disso, o Marco cria dois novos instrumentos jurídicos: o Termo de Colaboração(2) e Termo de Fomento(3). “A lei tomou o cuidado de reconhecer dois tipos de atividade que podem gerar parcerias entre a administração pública e as OSCs. Uma, de colaboração, tem começo, meio e fim. É aquela política pública proposta pela administração, que tem por obrigação executá-la. A outra, de fomento, é o reconhecimento e o incentivo a um projeto realizado pela organização social, mas que tem interesse público”, explica Laís.

ed25_mudanca_graficoPara celebrar um dos termos com a administração pública, a OSC deve ser pessoa jurídica de direito privado e sem fins lucrativos. Clubes, associações de servidores, partidos políticos ou entidades similares não poderão celebrar parcerias com a administração pública. No caso dos municípios, apenas entidades com um ano ou mais de existência podem participar.

A lei também não permite que os gestores exijam das organizações sociais, títulos ou certificados, o que significa que as entidades não precisam mais apresentar certificados de utilidade pública, concedidos normalmente pelas câmaras municipais, para celebrar um convênio. No âmbito Federal, este tipo de certificado, criado em 1935, foi extinto em dezembro passado. A medida visa a dar chances iguais de participação no chamamento, a todas as organizações que exercem a atividade.

Também foi criado o Acordo de Cooperação(4), para parcerias que não necessitam de transferência de recursos. O convênio(5), instrumento jurídico normalmente usado até então para celebrar as parcerias entre as OSCs e as administrações, passa a ser exclusivo para parcerias entre entes públicos, como governos estaduais e prefeituras, por exemplo. Aliás, esta já era a função original dos convênios.


 Em Glossário do Marco Regulatório

(1) Chamamento Público – tipo de concurso ou seleção pública para a escolha da melhor proposta para uma determinada ação ou serviço. É necessário quando o gestor precisa realizar parceria com uma entidade privada sem fins lucrativos, que envolve repasse de recursos públicos.
(2) Termo de Colaboração – utilizado quando a iniciativa é da administração pública, para a realização de uma política pública existente que precisa ser executada, acompanhada, pesquisada ou mesmo avaliada pela organização da sociedade civil.
(3) Termo de Fomento – utilizado quando a iniciativa é da organização da sociedade civil, tendo como objetivo ampliar ou consolidar uma política pública já em andamento ou que será criada. A intenção é apoiar uma ação da própria OSC que não é uma obrigação pública, mas tem interesse público.
(4) Acordo de Cooperação – utilizado nas parcerias realizadas sem transferência de dinheiro do poder público para a organização.
(5) Convênio – passa a ser exclusivo para parcerias celebradas entre entes federados, como governos do estado e prefeituras, ou governos federal e estaduais.


Melhor para a população

Lais de Figueiredo Lopes FOTO: Luiz Alves /Camara dos deputados

Lais de Figueiredo Lopes
FOTO: Luiz Alves /Câmara dos deputados

Uma das queixas mais frequentes das entidades antes da formulação da lei era que problemas burocráticos ou formais dos convênios muitas vezes embaçavam o resultado positivo de um bom projeto. Também não são raras as acusações de desvio de recursos públicos através de convênios com organizações sociais, o que gera na população uma certa desconfiança em relação a este tipo de parceria, dificultando o trabalho das entidades idôneas.

Com as regras para acesso aos recursos e de controle criadas pelo Marco Regulatório, a aposta é que o trabalho desenvolvido pelas organizações sociais passará a ser mais valorizado, com ênfase maior nos resultados atingidos e solução dos problemas, e não apenas na prestação de contas. Com isso, afirmam, é a população que sairá ganhando, pois haverá melhora no serviço. “A nova lei contribui para a descriminalização das organizações sociais e resgata a confiança pública nestas entidades”, diz Laís. É fato, também, que a nova lei traz critérios que dificultam a corrupção. Além de terem de estar com todas as suas obrigações legais em dia, não poderão possuir em seus quadros dirigentes ligados a gestores públicos ou condenados por improbidade administrativa.

Ao mesmo tempo, para realizar um chamamento público, a administração pública deverá antes definir os resultados que devem ser atingidos e dar publicidade às formas de controle público e social que serão adotadas. O chamamento também deve conter as áreas de abrangência do projeto, o volume de recursos disponíveis e os critérios de acesso.

OSCs pelo País

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea, as OSCs estão presentes em 5.552 cidades do País, ou 99,82% dos municípios brasileiros. Só com o Governo Federal, estima-se que pelo menos 15% delas mantiveram alguma relação direta ou indireta entre 2009 e 2013, de acordo com levantamento da Fundação Getúlio Vargas.

O estudo do Ipea aponta que, no nível federal, 28,5% afirmam ser religiosas, 12% informam atuar com cultura e recreação e 10,5% com assistência social. Outras 30,1% se enquadram na área de defesa de direitos e interesses dos cidadãos, o que inclui as áreas de saúde e educação.

O volume de recursos públicos que elas movimentam também não é inexpressivo: entre 2003 e 2011, por exemplo, o Governo Federal realizou R$ 29 bilhões de transferência para tais organizações, por meio da celebração de mais de 36 mil convênios. Não há um levantamento nacional, que abranja as esferas municipais, estaduais e Federal, sobre os principais motivos que levaram à assinatura de convênios, atualmente entre o poder público e as organizações sociais. Das parcerias realizadas apenas pelo Governo Federal, entre 2010 e 2013, a maior parte delas, ou 42%, foram para manutenção de unidades de saúde, segundo o Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse – Siconv.


E as parcerias já em andamento?

Com prazo de vigência fixo 
-Seguirão a legislação vigente na data em que foram assinadas (se houver atraso na liberação dos recursos, podem ser prorrogadas apenas pelo tempo equivalente ao atraso).

Com prazo de vigência indeterminado 
-Devem ser substituídas pelos instrumentos jurídicos da nova lei ou rescindidas.

Prorrogáveis em até um ano da entrada em vigor da lei 
-Devem ser substituídas pelos instrumentos jurídicos da nova lei ou rescindidas.


Viviane Raymundi